quarta-feira, 3 de outubro de 2012

FARC DEFENDEM A PARTICIPAÇÃO DO BRASIL NO PROCESSO DE PAZ


                    Apoio. Militares e helicóptero brasileiros usados no resgate de reféns libertados pelas Farc: apesar de fornecer armamentos à Colômbia, Brasil é visto com bons olhos pela guerrilha

              Apoio. Militares e helicóptero brasileiros usados no resgate de reféns libertados pelas Farc: apesar de fornecer armamentos à Colômbia, Brasil é visto com bons olhos pela guerrilha

RIO — As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) defendem a participação do Brasil no processo de paz colombiano. “É um país que tem tido uma boa posição. Sobretudo, não declarou as Farc terroristas”, justifica Marco León Calarcá, um dos quatro negociadores nomeados pela guerrilha para se sentarem à mesa de negociação. O primeiro encontro está previsto para ocorrer no dia 15 em Oslo. Depois, as reuniões continuam em Cuba, de onde Calarcá falou, por telefone, ao GLOBO.
No início do mês passado, o governo colombiano e a guerrilha anunciaram aquela que será a quarta tentativa de pôr um ponto final ao conflito, iniciado há 48 anos. A decisão tomada pelo governo do presidente Juan Manuel Santos significou uma guinada em relação à postura de confronto intransigente adotada pelo então presidente Álvaro Uribe (2002-2010), padrinho político de Santos e hoje uma das principais vozes críticas ao processo de paz.
- As Farc sempre quiseram tratar o problema nacional pelo diálogo e não pela guerra. Se as circunstâncias permitirem, esse será o caminho a seguir e esse será o caminho à paz - diz Calarcá, que nega o risco de que, uma vez firmado o acordo pela cúpula da guerrilha, grupos dissidentes possam manter vivo o conflito. -As determinações que se tomem numa mesa são compromisso para toda a organização. Não há espaço para que isso aconteça.
O processo conta com o apoio direto de Venezuela, Cuba, Chile e Noruega. O Brasil ficou de fora. O presidente Santos ligou para a presidente Dilma Rousseff pouco antes de anunciar o acordo. Segundo uma fonte da diplomacia brasileira, a ausência brasileira não causa nenhum prejuízo e está de acordo com a política “de resultados, não de prestígio” adotada pelo país.
Itamaraty ‘pronto a apoiar’
As Farc são consideradas uma organização terrorista pelos EUA (desde 1997) e pela União Europeia (desde 2002). Tanto Uribe como Santos tentaram convencer o Brasil a fazer uma declaração semelhante, mas sem sucesso. Isso fez com que o país ganhasse pontos com a guerrilha, como indica a declaração de Calarcá. Isso apesar de o Exército colombiano contar com aviões da Embraer para combatê-la, e de declarações como a feita pelo então ministro da Defesa Nelson Jobim, em 2010, de que receberia os guerrilheiros “à bala" se entrassem no Brasil.
Além disso, o acordo de cinco pontos discutirá temas como a questão agrária colombiana e o narcotráfico - a guerrilha, acusada por EUA e ONU de ser ativa no tráfico, é favorável à legalização das drogas, alegando ser uma forma de combater o fenômeno - além de prever a possibilidade de participação dos desmobilizados na política. Ou seja, caso o processo de paz dê certo, as Farc poderão emergir como um ator político convencional. Nessas condições, o peso brasileiro é outro atrativo.
- O Brasil é um dos países que têm importância latino-americana, que pode influir sobre a economia regional em eixos de grande alcance - diz Calarcá. - Nós sempre consideramos que são necessárias mudanças na vida colombiana e em todo o continente por igual. Se nos dão a possibilidade de fazer parte das decisões do país (Colômbia), bem-vinda seja.
Em nota, o Itamaraty afirmou que “o governo apoia o processo de negociação” e que, “na medida em que puder ajudar, o Brasil está pronto a continuar a apoiar o diálogo e as negociações.”
Professora da Universidade Nacional de Quilmes (Argentina) e bolsista do Ipea, Monica Hirst avalia que uma eventual participação brasileira seria positiva para o país, inclusive no que toca ao pleito de uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU.
Alguns analistas políticos afirmam que a recente chegada ao poder de governos de esquerda - como os liderados pelos ex-guerrilheiros Dilma Rousseff e José Mujica (no Uruguai) - é um dos estímulos à desmobilização das Farc. Calarcá vê o caso colombiano nesse contexto.
- O conflito colombiano com certeza parece muito com (os de) Brasil, Uruguai, Paraguai e Chile.
O negociador das Farc também indica que não irá exigir que o cessar-fogo, um dos pontos do plano de paz, seja uma condição para os diálogos. Santos diz que não haverá tréguas.
- Tem que se chegar a isso no momento claro. Quando já houver todos os elementos em concordância e definidos na mesa, então se acordará como fazer o cessar-fogo - diz Calarcá.
Mas, enquanto Santos tem dito que o processo de paz será uma questão de “meses, não de anos”, o negociador da guerrilha prefere rejeitar quaisquer limites de tempo.
- O importante é que o acordo saia, e não o tempo.


Fonte: O GLOBO
Edição: Antonio Luis

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